O Brasil no Índice Doing Business 2019
O mercado financeiro é, pelo menos em alguma instância, um espelho do setor produtivo dos países no mundo. No Brasil, no entanto, é fato que tanto o setor produtivo como o financeiro são altamente regulados e sofrem problemas para gerar riqueza devido a diversos empecilhos, regulatórios / legais, infraestruturais ou simplesmente de mão de obra. Neste artigo, serão abordados os problemas do Brasil e a sua colocação no ranking atual do Banco Mundial “Doing Business”.
De início, cabe localizar a nação no índice que mede a facilidade de fazer negócios no mundo, e o achado não é nada animador. Quando o referencial é o resto do planeta, o Brasil localiza-se na 109ª posição entre os 190 países que compõem o levantamento, entre os quais Nepal, Namíbia e Nova-Guiné. Se a pesquisa for encurtada para a América Latina e Caribe, onde a amostra cai para 31 países, a república brasileira também não está em pé de competição, ficando na 15ª posição, ultrapassada por Panamá e Jamaica, entre outros.
Além do ranking, o Banco Mundial também é responsável por divulgar um relatório que detalha a situação para abertura e manutenção de firmas nos países pesquisados. A instituição separa este relatório análise em 11 indicadores, que vão desde a facilidade para se obter energia para seu negócio até a resolução de insolvências. Neste artigo, quatro deles – facilidade para iniciar negócios, pagamento de impostos, cumprimento de contratos e regulação do mercado laboral –serão expostos para dar ao leitor uma visão resumida do mundo empresarial do Brasil.
Talvez o ponto mais popularmente clamado seja a dificuldade que os brasileiros enfrentam para registrar seus negócios. De acordo com dados do Banco Mundial, o tempo para que seja registrada uma nova empresa em São Paulo é, em dias, o dobro do tempo médio para a mesma atividade em países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). São aproximadamente 9 dias para a OCDE e 18 para o Brasil. Se destrinchadas as razões, as descobertas são de um procedimento burocrático e extremamente engessado, que inclui dias de espera para averiguar a disponibilidade do nome (razão social) da empresa e a viabilidade de sua localização, além de outra semana para acertar detalhes de ICMS e CNPJ com a junta comercial local, no caso a JUCESP. A situação piora se o objeto de estudo for o Rio de Janeiro, onde o tempo apenas para iniciar o negócio é de 20 dias.
O processo de pagamento de impostos segue a mesma linha. É interessante pensar que, em São Paulo, empresas passem incríveis 1.958 horas, o equivalente a três meses do ano produtivo, apenas lidando com o procedimento do pagamento de seus lucros ao governo – o que simboliza um custo não-monetário por si só para as firmas em território nacional. Esses três meses poderiam ter sido usados para produção, por exemplo. Não restringindo-se ao complexo processo de pagamento de impostos, há, ainda, o fato de que a contribuição total feita para o Estado simplesmente excede em muito todos os parâmetros de comparação, seja no âmbito da OCDE ou da América Latina. Dessa forma, os brasileiros pagam uma alíquota grande de seus lucros para o governo e ainda gastam tempo demais fazendo isso. É quase uma maratona.
Em 2006, o Banco Mundial publicou um interessante estudo sobre onde a riqueza das nações se encontrava, fazendo, inclusive, uma bela referência ao livro de Adam Smith, e os resultados seriam os mesmos encontrados pelos institucionalistas: as instituições formais de uma sociedade são de grande relevância para sua produção de riqueza. Nesse estudo, há a “descoberta” de que possíveis impulsionadores da produtividade, como o nível de favorabilidade do sistema jurídico local ao funcionamento do mercado, são parte residual do capital intangível que leva à prosperidade. Em consonância com essa análise, o indicador de cumprimento de contratos do relatório de 2019, responsável por avaliar o tempo e o custo de uma disputa comercial em primeira instância, traz notícias desanimadoras para possíveis investidores. Embora a qualidade das decisões judiciais tomadas em território nacional sejam um pouco acima da média da dos países desenvolvidos, o tempo para que isso aconteça é extraordinariamente alto, de forma a criar incertezas e sobrecustos acerca do futuro das decisões empresariais no Brasil.
Por fim, as barreiras para fazer negócios no Brasil chegam às margens da regulamentação laboral nacional. Como principal representante desse tema, há a CLT – Consolidação das Leis do Trabalho –, um conjunto de normas trabalhistas formalizado em 1940 com base na Carta del Lavoro italiana. À época, quando o Brasil era uma sociedade basicamente rural e as relações trabalhistas estavam, ainda, muito abusivas, essas normas vieram como um bote salva-vidas para o trabalhador. Com o passar dos anos, no entanto, de acordo com especialistas em direitos trabalhistas, elas foram incorporando “itens e dispositivos que guardam características paternalistas e protecionistas” – e que agora são úteis apenas para causar temor na decisão de contratar ou não um funcionário, não mais representando a realidade das relações de trabalho. Prova disso está nos resultados da minirreforma trabalhista do ex-presidente Michel Temer, que nos deixa de legado uma perspectiva mais positiva das oportunidades de trabalho, sendo apenas limitada por outras razões do contexto atual do país, como a tensão envolvendo a Reforma da Previdência bolsonarista.
Em resumo, delimitam-se alguns dos problemas que retraem o investimento e a confiança no setor produtivo brasileiro e impedem a prosperidade da nação como um todo, quando se entende que toda a estrutura de negócios do país está comprometida. É fato que um punhado de reformas estruturais são necessárias para avanços consideráveis da nossa economia, e a Previdência parece ser somente o começo de uma grande batalha no Congresso Nacional para quem quiser marcar seu nome no progresso brasileiro.
Rai Gomes
Membro de análise Macroeconômica do CEMEC, empresa júnior vinculada ao IBMEC, que tem como proposta principal realizar estudos e pesquisas sobre o mercado financeiro.