A retomada de Portugal
A economia portuguesa passou por diversas transformações. Durante a década de 90, por exemplo, Portugal seguiu a política econômica determinada pelos critérios da União Econômica e Monetária (UEM). O processo foi concluído com êxito, tendo Portugal se integrado à Zona do Euro desde a sua criação, implicando no cumprimento de um conjunto de critérios quantitativos, associados à continuidade de uma política macroeconômica rigorosa e credível.
Entretanto, veio a crise da dívida pública, que se deu no ano seguinte ao estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos, em 2008. O fato devastou a Europa e afetou principalmente os países financeiramente mais frágeis. E, Portugal – que, de acordo com um estudo feito pelo Fórum Econômico Mundial sobre competitividade, tinha um mercado de trabalho pouco flexível, uma administração pública e burocrática ineficiente, um regime fiscal complexo e maus indicadores macroeconômicos – foi fortemente afetado. Visando sair da crise, Portugal fez um forte pacote de austeridade entre 2011 e 2014, época em que contava receber cerca de 78 bilhões de euros da União Europeia e do FMI para conseguir pagar suas dívidas. Contudo, em 2014, o crescimento do PIB continuava negativo, e o desemprego chegava a 15%.
Entre 2011 e 2014, o governo do então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho fez cortes drásticos na saúde, na educação e ainda aumentou os impostos. No começo de 2014, Portugal conseguiu terminar de pagar seus credores, o que levantou a questão de se o país manteria as duras políticas. Seu sucessor, António Costa, chegou ao poder em 2015 prometendo acabar com a austeridade a qualquer custo, com medidas de reversão do corte de salários no setor público. Além disso, aumentou o salário mínimo em 20% por 2 anos.
Quando António Costa assumiu, Portugal estava com um déficit orçamentário de 4,3% do PIB, e existia um acordo entre Portugal e a União Europeia que previa multa caso o déficit orçamentário fosse maior que 2,7% do PIB. Em 2016, porém, a UE concedeu um adiantamento por um ano para que Portugal conseguisse cumprir o acordo. Desde então, vem superando suas metas de déficit, como em 2018, quando atingiu 0,7% do PIB, o menor percentual dos últimos 45 anos, e com a projeção para um número próximo de zero ainda este ano.
No último trimestre de 2018, o PIB português desacelerou, mostrando fraqueza diante do declínio da Zona do Euro. Entretanto, o Instituto Nacional de Estatística (INE) mostrou que, após dez anos, a economia portuguesa se recuperou e superou a dimensão que havia em 2008, atingindo um novo PIB recorde.
Todavia, mesmo com todos os progressos, Portugal continua tendo a terceira maior dívida pública da União Europeia. De acordo com o governo, as projeções cumprem os compromissos de redução de dívida pública assumidos por Portugal no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Depois de uma década de crises e recuperação, Portugal fez um grande progresso. O crescimento real do PIB está acima do nível antes da crise, a taxa de desemprego está abaixo da média da zona do Euro desde 2017 e o clima para negócios está mais atraente para os investidores. Além disso, pagou suas obrigações com o FMI cinco anos antes do previsto.
A economia foi reequilibrada, tornando-se mais voltada para a exportação, forçando as empresas a competir com todos os países do mundo, não apenas com o mercado europeu. Além disso, o setor turístico foi reestruturado. Com isso, as contas com os déficits crônicos de cerca de 10% do PIB passaram para equilibradas. Com essas melhorias, o perfil de economia em risco de Portugal caiu, o que reforçou sua resiliência aos choques.
Portugal cresceu acima do potencial estimado há algum tempo, refletindo o momento da recuperação e o ambiente externo positivo. O verdadeiro desafio e real objetivo é manter e melhorar as perspectivas de crescimento a longo prazo. Felizmente, não há motivos para questionar se ocorrerá uma brusca mudança acerca do crescimento alcançado. Por exemplo, os empréstimos inadimplentes estão diminuindo no setor bancário, o que libera capital para atender outras necessidades da economia. A queda acentuada de desemprego tende a ser permanentes. Após as medidas do atual governo, capitaneadas pelo primeiro-ministro António Costa, Portugal contorna seu período de crise dez anos depois, rumo ao crescimento econômico. E deixa uma lição para o resto da Europa: no campo da política econômica, o conflito e a ação unilateral apenas aumentam as vulnerabilidades.
Lívia Chaves
Membro de Análise Macroeconômica do CEMEC, empresa júnior vinculada ao IBMEC, que tem como proposta principal realizar estudos e pesquisas sobre o mercado financeiro.