Do Futuro que se tornou Presente: Fintechs, uma breve abordagem.
No que concerne às inovações tecnológicas, o mercado financeiro é uma mostra do quanto o desenvolvimento de novos mecanismos operacionais viabiliza a exploração – ou mesmo criação – de novos nichos mercadológicos. Como parte disso, no último triênio, citam-se as Fintechs como principais expoentes da área. Os recentes acontecimentos, com o Banco Central decretando liquidação extrajudicial de uma das grandes do setor, voltaram ainda mais os olhos da mídia para o segmento.
Com a transferência de muitos serviços para o âmbito digital, o mercado não poderia ficar alheio às transformações. É nesse contexto, marcado pelo translado rumo ao virtual, que surgem as fintechs. Originário de um programa de apoio às startups, desenvolvido pela Prefeitura de Nova York em parceria com a iniciativa privada, o termo que designa tais instituições é uma junção dos termos “financial technology”. Sendo parte de um processo que envolve armazenamento na nuvem, assim como o Big Data, as mesmas tornaram-se sinônimo de interlocução entre cliente e instituição. Com isso, passaram a atrair a atenção do grande público, devido a seu baixo custo “utilizacional”, assim como despertaram o interesse de gigantes do sistema financeiro, devido ao seu ínfimo custo operacional, frente à rentabilidade.
No pós-crise de 2008, com o abalo sofrido por todas as gigantes do setor, ascendeu como prioridade a ideia de obter retornos efetivos, minimizando os riscos e maximizando os lucros. Em 2010, nos Estados Unidos, o fenômeno das startups do setor financeiro surge com total aporte frente a novas demandas. Grupos de bancários que haviam sido demitidos, investidores que tinham perdido suas aplicações e jovens universitários com visão empreendedora compunham o grupo que criava escritórios na garagem de casa, vislumbrando uma nova modalidade que aproximasse o cliente da sua financeira. Nesse cenário, os jovens voltaram-se para o mercado de crédito. Reproduzir as tradicionais idas aos bancos, diminuindo o tempo de espera – ou mesmo eliminando-o – tornou-se o vetor norteador para tais iniciativas.
No Brasil, tendo desembarcado em 2012 e deslanchado no início de 2015, o fenômeno tomou, rapidamente, proporções gigantescas. Concomitante ao aumento de atuações na especificidade da área, foram desenvolvidos outros fenômenos, como o “Open Banking”, no qual redes bancárias trabalham em conjunto com desenvolvedores voltados para o gerenciamento do processo de dados. Em outros termos, há um compartilhamento de dados estatísticos e proprietários, voltados para atender um número cada vez maior de clientes buscando atendimento personalizado e rápido. Tal combinação, aliada ao momento de incertezas provocadas pelas indefinições políticas e das instituições, corrobora para a captação e levantamento de recursos, vindos de fundos que querem expandir sua atuação. Como resultado, de acordo com levantamentos de consultorias bancárias, só no ano de 2017 tais startups receberam cerca de 457,44 milhões em investimentos, o que foi suficiente para manter o Brasil no Top 10 global do setor.
Com o crescimento e amadurecimento das empresas, elas acabam por abocanhar cada vez mais os diferentes públicos, atraindo o olhar das grandes corporações. Ainda em 2017, de acordo com a Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), o país contava com 320 jovens empresas. Portanto, numa era de fácil acesso aos smartphones, os dados comprovam a ideia de que o brasileiro, cada vez mais, evita ir ao bancos tradicionais. Consequentemente, numa conjuntura de alta demanda e diversidade de oferta, o cliente é quem sai vitorioso.
De acordo com o Banco Mundial, em 2016, o Brasil era o terceiro colocado global no quesito uso de cartão de débito e também de crédito, perdendo apenas para os EUA e o Reino Unido. Aliando-se esses dados ao já citado emparelhamento digital – devido à multiplicação e à variedade de modelos de smartphones – da grande população, obtêm-se uma das mais promissoras trilhas de investimento atuais. Tendo tal conjuntura, pode-se discorrer acerca do impacto frente às tradicionais – físicas – agências bancárias.
Usando de APIs (Application Programming Interface) e BaaP (Bank-as-a-Platform), as Fintechs ousaram entrar no seleto grupo de players do Mercado Financeiro. De um lado, tem-se os bancos tradicionais com sua ampla malha de agências, marcas e capital consolidado. Estes, historicamente, já possuem a credibilidade necessária para perpetuar seu posicionamento. Do outro lado, avistam-se as Fintechs. Muitas nascidas em quartos ou repúblicas estudantis, as mesmas surgem com uma proposta simples e de fácil entendimento: por que ir ao banco, quando você pode transferir valores ou efetuar empréstimos com pouco menos de 5 toques na tela do seu celular? É dessa dicotomia que surge a integração entre o sistema físico e a nuvem, responsável por armazenar e operar – sem uso de caixas eletrônicos, funcionários ou custos elevados de manutenção – as transações realizadas por aparelhos celulares.
Entretanto, apesar do crescimento valoroso anual no Brasil, ainda há alguma resistência quanto à efetividade na adoção do uso de apps como meio principal de gerenciamento pessoal. Em 2015, estimava-se que, para cada 100 mil clientes, existiam 47 agências físicas. Portanto, como explicar o fato de termos uma das populações mais “conectadas” do globo, ao mesmo tempo que a grande maioria da mesma recusa-se a abandonar as antigas práticas ?
De acordo com pesquisa (2017) feita pela Fecomércio – RJ em conjunto com o instituto Ipsos, o smartphone tornou-se o principal meio de acesso ao mundo virtual, representando cerca de 69% dos usuários. Tal dado revela um crescimento expressivo em relação ao ano de 2015, totalizando 11%.
Entretanto, atentar-se aos fatores idade e renda faz-se indispensável. O mesmo levantamento mostra que o percentual de usuários decai de acordo com a diminuição da renda. Da mesma forma, demais levantamentos demonstram que, quanto mais avançada a idade, menor é o número de usuários ativos ante os serviços digitais. Num país que tem cerca de 26 milhões de idosos, apenas 40% destes estão inclusos no público que usa do aparelho diariamente, assim como apenas 13% usam o aparelho para efetuar pagamentos.
Logo, num país com projeção de 37,9 milhões de idosos (IBGE) para 2027, adaptar-se ao público da terceira idade é um dos grandes desafios para as jovens empresas de serviços financeiros. Cada vez mais, os mesmos fazem-se mais presentes e antenados com o mundo digital, mas, ao mesmo tempo, ainda possuem algum tipo de desconfiança quanto a segurança e legitimidade nas transações virtuais.
No cenário global, o Goldman Sachs estima que os donos das tradicionais agências físicas perderão US$ 4,7 trilhões para as dezenas de startups que são criadas diariamente. No Brasil, por exemplo, o número de fintechs saltou de 54 em 2015, para 244 em meio ao ano de 2017, com este número em crescente – como já foi dito – expansão. Nesta disputa, o desenvolvimento de novas plataformas é um resultado importante, assim como o do setor de tecnologia como um todo.
Cada vez mais é requerida uma mão de obra – ainda pouco divulgada – para tratar dos enormes bancos de dados, assim como especialistas em estudos de mercado. As fintechs já não são mais o futuro, elas já fazem-se protagonistas do construtivo e inflexível presente.
Em síntese, resta monitorar a evolução do nicho e observar as transformações dos bancos – principais “afetados” pelas fintechs – que incluem a já citada digitalização, assim como os desdobramentos e as medidas do Banco Central frente um setor inovador.
José Wellington
Trainee do CEMEC, empresa júnior vinculada ao IBMEC, que tem como proposta principal realizar estudos e pesquisas sobre o mercado financeiro.