França: uma corrida ideológica à presidência
Ultimamente, os olhos da mídia mundial têm observado com bastante carinho a eleição francesa que ocorrerá em abril e, caso haja segundo turno, em maio. Muitos brasileiros desconhecem como isso pode afetar o mundo. A França está entre as principais economias do planeta, e sua política externa acaba sendo muito importante para o funcionamento do mundo globalizado. Diante disso, o estudo dos possíveis candidatos franceses e as consequências das eleições para a França e o resto do mundo passam a ter relevante importância.
Antes de introduzir as ideias dos principais candidatos, torna-se fundamental destacar alguns aspectos do regime vigente na França. O país, atualmente, é uma república semipresidencialista, ou seja, possui a presença de um presidente e de um primeiro-ministro. Diferentemente de outros países semipresidencialistas – onde o poder do primeiro-ministro se sobrepõe em quase todos os aspectos ao do presidente – na França, o presidente tem muitas atribuições, dentre as quais está a função de nomear o próprio primeiro-ministro do país.
Atualmente, o país é presidido por François Hollande, eleito pelo Partido Socialista, mas que é visto como um dos piores líderes da história, amargurando ínfimos 4% de aprovação pela população francesa. Diante disso, o mesmo nem quis tentar uma reeleição, tendo sido alvo de críticas de seu próprio partido. A começar pelo atual candidato do partido, o socialista assumido Benoît Hamon, que acusa Hollande de desvirtuar os ideais partidários, tendo adotado uma postura econômica pró-mercado e causado, por isso, a rejeiçao de muitos franceses simpatizantes da causa socialista.
Ao analisar as propostas de Hamon, percebe-se que quer representar esses ideais partidários. Para isso, pretende reduzir a jornada semanal de trabalho de 35 para 32 horas; cobrar tributações sobre robôs, uma vez que acredita que, em poucos anos, grande parte da população terá essas máquinas e isso causará mais desemprego; e implementar uma renda básica universal de cerca de 800 euros para jovens entre 18 e 25 anos, independentemente de seu salário pessoal ou familiar. Apesar de fazer brilhar os olhos socialistas, os franceses não parecem muito empolgados com essas propostas, e Hamon vem ocupando as últimas colocações das pesquisas de intenção de voto, atrás de François Fillon, Marine Le Pen e Emmanuel Macron.
Fillon é um político filiado ao Les Républicains e ocupou o cargo de primeiro-ministro da França durante o governo de Nicolas Sarkozy (2007 a 2012). O candidato se diz admirador dos ideais econômicos de Margaret Thatcher – ex-primeira-ministra britânica que ocupou o cargo entre 1979 e 1990 e prometeu acabar com 500 mil empregos do setor público, cortar gastos do governo, reduzir impostos e acabar com o poder dos sindicatos. Socialmente conservador, manifestou-se a favor de valores religiosos católicos, se opondo ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e a permissão de adoção de crianças concedidas a homossexuais. Em alguns debates, defendeu que a identidade francesa deve ser protegida, uma vez que não são uma nação multicultural.
O candidato vinha tendo destaque nas pesquisas, sendo apontado com chances de vitória, até que foi envolvido em um escândalo de corrupção. Fillon foi acusado de empregar sua esposa e dois de seus filhos, pagando-lhes salários acima do normal. Empregar familiares, na França, não é ilegal para políticos. O grande problema é que a esposa do conservador disse, em uma entrevista anos atrás, que nunca tinha sido assessora de seu marido. Isso levantou as suspeitas sobre o candidato, que se recusou a desistir das eleições. Sua popularidade despencou, enquanto um candidato independente crescia nas pesquisas.
Trata-se de Emmanuel Macron, o mais jovem dos candidatos, com 39 anos de idade, que trabalhou em um banco de investimentos e foi ministro da economia durante parte do governo de Hollande, tendo renunciado para dedicar-se à sua candidatura. Por não fazer parte de nenhum partido, criou seu prório movimento, o “En Marche” (em português, algo similar a “em movimento”), que vem atraindo simpatizantes e pode vir a se tornar efetivamente um partido no futuro. O candidato liberal tem sido acusado de impreciso quanto às suas propostas, uma vez que não apresentou um plano de governo concreto. Em algumas declarações, chegou a dizer que se acha apto a unir o povo francês e tem intenção de reviver a economia francesa, estimulando a inovação das pessoas e empresas, cortando burocracias e afrouxando as duras leis trabalhistas existentes na França. Em relação à segurança e à educação, prometeu aumentar o orçamento de defesa nacional para 2% do PIB, contratar mais policiais e aumentar a verba para educação. O candidato é visto como uma possível chance de recuperação para a União Europeia (UE), tendo manifestado intenção em reformar o bloco.
Por último, surge Marine Le Pen, filiada à Frente Nacional, partido nacionalista de direita pelo qual seu pai foi candidato à presidência em 2002. A candidata, classificada pela mídia como de extrema-direita, adotou propostas que fazem jus à característica nacionalista de seu partido. Suas ideias estão diretamente ligadas ao aspecto social, não dando tanto destaque a sua política econômica, que foi classificada de vaga por parte da mídia. Le Pen enaltece o povo francês, prometendo tributar importações e contratos de trabalho oriundos de outros países, reduzir a idade de aposentadoria, aumentar benefícios sociais e diminuir o imposto de renda. Planeja restringir a entrada de imigrantes na França, expulsando os ilegais e adotando um discurso de combate ao islamismo, além de ser a favor de uma educação gratuita para o povo francês. A vitória de Le Pen poderia significar um “Frexit”, saída da França da UE, seguindo o caminho da Inglaterra.
Dentre os candidatos citados, Le Pen chegou a ser favorita, mas as pesquisas apontam o significativo crescimento de Macron, chegando a dizer que este derrotaria a nacionalista no segundo turno, que ocorrerá em maio. Considerando que as propostas dos dois divergem em diversos aspectos, fica difícil afirmar qual será a política externa do país após as eleições, principalmente no que diz respeito à UE e aos imigrantes islâmicos. Por enquanto, nos resta torcer para que o povo francês faça uma boa escolha e que a nação colha bons frutos nos próximos cinco anos.
Pedro Guerra
Estudante de Economia do IBMEC. Membro da área de Análise Macroeconômica do Cemec, empresa júnior vinculada ao IBMEC, que tem como proposta principal realizar estudos e pesquisas sobre o mercado financeiro.