A Bolsa está LEVE?
Você certamente já ouviu esta expressão: “A bolsa está LEVE!” Meu falecido pai a usava com frequência, quando eu, ainda na faculdade, engatinhava no mercado.
Faz uma década que escrevi um artigo, no jornal Valor Econômico, onde registrava minha incompreensão com o movimento das bolsas americanas naquele momento. Nele salientava uma análise de um gestor americano, publicada numa agência de notícias, onde ele afirmava que os dados ruins da economia americana, divulgados no dia, indicavam que o Fed não subiria a taxa de juro, o que, consequentemente, apontava para um cenário favorável para as ações.
Mercados de ações são idiossincráticos! O humor dos investidores é determinante para seu desempenho. Se o humor está bom, pegam notícias ruins e a transformam em positivas e vice-versa. Mas será que é correto ser dessa forma?
Basicamente, em minha experiência de três décadas, aprendi que o investimento em bolsa pode ser explicado por quatro grandes fatores: 1) Liquidez, 2) Economia, 3) Valuation e 4) Empresas.
No primeiro, se o mercado está com abundância de liquidez, o preço do dinheiro (taxa de juro) estará baixo. Logo, o custo de oportunidade do investidor é, muitas vezes, insignificante, o que o leva a querer correr mais risco, para obter ganhos mais expressivos com as ações.
No segundo fator, se a economia estiver forte, os lucros das empresas abertas tendem a se elevar, o que enseja maior demanda por ações das mesmas.
Em relação ao valuation, os investidores qualificados (fundos de pensão, por exemplo) tomam decisões norteados pela análise fundamentalista, para descobrir se a empresa está (ou não) próxima do seu preço justo. Assim procedem, tanto pela metodologia do fluxo de caixa descontado, quanto pelos múltiplos.
No tocante ao fator empresa é importante entender se o mercado que se está analisando é constituído por empresas sólidas e com alto padrão de governança corporativa, para que o investidor possa operar tranquilamente, sem ser pego de surpresa pelos “petrolões da vida”.
Inspirado na expressão do meu pai, criei um acrônimo para ensinar aos meus alunos que devemos investir em ações quando a mercado satisfaz as condições “LEVE”, ou seja, evidenciamos, preponderantemente, os quatro efeitos descritos acima de forma positiva. O problema maior é captar o humor dos investidores, para entender a quais dos fatores eles estão dando ênfase. Explico melhor.
Nos últimos anos, o mundo encontra-se em abundante liquidez e taxa de juro próxima de zero nas economias centrais. Em algumas regiões e países encontramos, inclusive, juro negativo, caso do Japão e da área do euro. Em relação à economia americana, o Fed elevou a taxa de juro no final de 2015, porém parece inseguro em prosseguir com o aperto monetário.
Nesse período recente, o desempenho das bolsas internacionais foi dominantemente de alta, muito por causa dessa abundante liquidez global. É claro que houve, igualmente, uma recuperação tímida da economia americana, que colaborou. Mas o fator que preponderou foi, sem duvida, o juro próximo de zero.
Se analisarmos, contudo, o comportamento da bolsa brasileira, observaremos que, a despeito de taxas de juros baixíssimas no mundo, a situação foi diferente. Amargamos resultados pífios no último biênio. Ou seja, os investidores, a meu juízo, deram maior destaque à economia, ao valution e à qualidade de governança de nossas empresas, envolvidas em escândalos e tragédias ambientais.
Nesse momento, estou preocupado com o mercado externo. Acredito que os investidores internacionais estão, como àquela oportunidade, olhando só o fator liquidez. Estão dando de ombros para os efeitos do Brexit e as implicações do mesmo sobre a economia europeia. Enfatizo que não enxergo nesse evento o potencial devastador de um Lehman Brothers, mas ele está longe de ser desprezível. Se o mercado voltar a avaliar que notícias ruins da economia global ensejam um Fed mais dovish, o que seria bom para as bolsas, temo pelo porvir.
No mercado local, no entanto, não acredito que o efeito liquidez será o determinante, para 2016 e 2017. Caso o cenário prevalecente seja o de afastamento definitivo da presidente Dilma, a esperada consertação da economia, com a equipe capitaneada por Henrique Meireles e Ilan Goldfajn, provocará uma melhora de expectativas. Em minha visão, uma queda expressiva da Selic deve ocorrer até o final do ano que vem, e a economia, até agora anêmica, deverá se recuperar gradativamente, o que ajudaria a bolsa. Ademais, há um processo de “limpeza” ética em curso no país, com a operação Lava-Jato, que certamente produzirá efeitos benéficos no quesito governança.
Por fim, como professor, devo ressaltar que investimentos em ações precisam ter um horizonte de longo prazo. Os riscos desse mercado são enormes, se comparados aos investimentos mais tradicionais de renda fixa. Minha sugestão é usar a seguinte regra: admitindo o tempo de vida médio de 80 anos, subtraia sua idade desse número. O resultado seria o percentual da carteira que o investidor deveria alocar em investimentos de maior risco, como ações. Por exemplo, para alguém com 20 anos, a carteira de investimentos seria composta por 40% em renda fixa e 60% (80-20) de investimentos em renda variável. Em outras palavras, quanto mais jovem for o investidor, mais ris co ele pode assumir, com maiores chances de êxito no longo prazo.