Perspectivas e desafios para o mercado financeiro em 2024

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Como exploramos no texto Da desconfiança às surpresas positivas: a evolução do cenário em 2023, o ano que termina deixa desafios plantados para 2024.

Visão geral

Com 2023 chegando ao fim, é hora de olhar para os desafios e oportunidades que teremos em 2024. Diferentemente do ano que passou, para 2024 vemos um cenário relativamente mais positivo do que o vislumbrado em janeiro deste ano. Isso, porém não quer dizer que não existam desafios importantes para acompanhar por isso, desde já estamos realizando nosso estudo com os gestores para entender a evolução das percepções do mercado sobre o que está por vir. 

Identificamos quatro temáticas macro que vemos como mais relevantes para a formação dos preços no ano que vem: a implementação do arcabouço fiscal, a regulamentação da Reforma Tributária, o processo de afouxamento monetário nos Estados Unidos e por fim, em dezembro de 2024 as novas indicações para o Banco Central.

O Arcabouço Fiscal entrará em vigor na virada do ano. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, venceu a batalha preservando como meta um resultado primário zerado, mas essa guerra ainda terá novos episódios.

Enxergamos março como um mês-chave para compreender como será a dinâmica das contas públicas. A partir da divulgação do Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias, caso verificada a frustração na arrecadação ou o aumento das despesas obrigatórias que venham a comprometer o alcance das metas fiscais, torna-se necessária a adoção do contingenciamento. Contudo, a limitação da execução de parte da programação orçamentária tem um impacto político importante, especialmente em ano de eleições municipais. A nova versão da LDO restringe o bloqueio das despesas discricionários a R$23 bi, porém mesmo assim, o Novo PAC, deve ser diretamente impactado, comprometendo o andamento das obras públicas prometidas pelo governo. Como Lula e a equipe econômica vão conciliar as demandas políticas com essa nova regra fiscal é objeto de dúvidas no mercado. 

A aposta do Ministério da Fazenda para minimizar essa desconfiança é que medidas arrecadatórias como a MP das Subvenções (MPV 1185/2023), o PL das Bets (PL 3.626/2023) sejam aprovadas ainda em 2023. Com essas vitórias no Congresso, estima-se um aumento de pelo menos R$37 bilhões para 2024.

A PEC 45/2019 que trata da Reforma Tributária foi aprovada no dia 15 de dezembro na Câmara, o texto agora segue para ser promulgado, mas diversas dúvidas ainda permanecem. Pelo menos 71 pontos precisarão ser detalhados em lei complementar. A própria PEC estabelece o prazo de 180 dias da data da promulgação para o encaminhamento da regulamentação. Os técnicos da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária trabalham com a expectativa inicial de três leis: uma para os novos tributos, outra para o comitê gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e uma terceira para o Imposto Seletivo. Mas essa estrutura pode ser alterada.

Essas leis complementares vão estabelecer questões centrais para o novo sistema, desde fato gerador de cada tributo, as alíquotas, quem deve pagar e para quem. Além disso, precisa ser melhor definido o papel do comitê gestor do IBS, que vai arrecadar, administrar e distribuir o imposto. Essa é uma entidade que acumulará bastante poder e é tópico de disputas políticas importantes. As exceções e particularidades dos regimes diferenciados também devem ser regulamentadas nessa segunda etapa.

O prazo que o governo estipulou para esse processo legislativo, casa com um calendário eleitoral em 2024. Tradicionalmente, quando há eleições municipais, a análise de pautas relevantes se concentra na primeira metade do ano, de modo que o Congresso fica com a agenda do segundo semestre voltada para suas bases eleitorais. Assim, com um período curto para apresentação e análise de temáticas extremamente sensíveis, antecipamos que ano que vem essas difíceis dicussões podem elevar a volatilidade dos mercados.

Ainda sem sabermos como será o desfecho dessas leis complementares, fica incerta a incorporação dos benefícios da reforma tributária nos cenários prospectivos. Fora isso, dado o longo período de transição, para a atividade econômica, os ganhos potenciais ficam para depois de 2024, que é o foco do presente texto.

No exterior, desde o final do ano passado, enxergamos expressiva volatilidade nas expectativas do mercado em relação à curva de juros americana, como fica evidenciado no gráfico abaixo. Em outubro, com receios fiscais e cautela após o início do conflito no Oriente Médio, as taxas dos treasuries atingiram seu máximo, com mais de 5,0% a.a. para os vencimentos de 10 anos, algo que não acontecia desde 2007, na crise do Subprime. Contudo, após a prorrogação do prazo para a votação do orçamento americano, a percepção de que o conflito não escalaria e a comunicação mais dovish dos dirigentes do Fed, os rendimentos dos Treasuries voltaram a cair. 

A grande surpresa foi a resiliência da atividade econômica frente uma política monetária bastante restritiva. Todavia, o Fed parece ter chegado ao final do ciclo de aperto monetário. O  mercado já precifica o início do ciclo de afrouxamento a partir de março de 2024, na segunda reunião do ano, de acordo com a ferramenta CME Group. Em suas comunicações, o presidente do Fed, Jerome Powell, admitiu o início de debates em torno do ciclo de cortes, mas o Comitê segue sem dar sinalizações claras de quando os cortes se iniciarão, se apoiando em um discurso de data dependent. Na Órama, dado o cenário de inflação ainda elevada, atividade forte e as mensagens que vêm sendo passadas pelo Comitê americano entendemos que o processo de cortes deve começar em meados de 2024. 

A forma como o Lula lidaria com um Banco Central formalmente autônomo era uma das preocupações do mercado. No início de 2023, as constantes críticas do presidente ao trabalho do BC elevaram as dúvidas sobre o perfil dos possíveis indicados para ocuparem as vagas no Copom, à medida que os mandatos dos membros atuais terminassem. Apesar do ceticismo, as quatro indicações, até o momento, não desagradaram o mercado. Cabe destacar que dois dos novos membros vão entrar na composição do Comitê somente a partir de janeiro. 

A grande apreensão, contudo, se volta para o fim de 2024, quando mais três cadeiras ficam vagas, inclusive a da presidência do BC. A partir de 2025, em consonância com a Lei Complementar 179/2021, Lula já terá indicado 7 dos 9 membros do Copom. Dada a institucionalidade já consolidada do BC, no nosso cenário base, não trabalhamos com uma mudança na condução da política monetária. Porém, identificamos como um dos riscos a serem monitorados a possibilidade, ainda que improvável, de uma nova composição do BC eventualmente se tornar mais leniente com o nível de inflação, em prol de uma atividade mais forte.   

Uma vez apresentados os grandes riscos que vemos para o ano de 2024, vamos passar o nosso cenário e projeções para os principais indicadores de mercado. Para enriquecer o material, no questionário de novembro para os gestores, incluímos a pergunta sobre as projeções das casas para o fim de 2024. 

Juros:

Na Órama, trabalhamos com o BC terminando o ciclo de corte com a taxa Selic em 9,5% a.a. atingindo esse patamar na reunião de agosto.

Apesar de reconhecermos o bom comportamento da inflação brasileira, principalmente da inflação subjacente, entendemos que a desancoragem parcial das expectativas, assim como o hiato do produto mais apertado, somado a um risco de descompasso com o Fed, limita a aceleração da magnitude dos cortes no curto prazo. Assim, esperamos quatro cortes de 0,50 p.p. seguido por um final de 0,25 p.p., atingindo os 9,50% na quinta reunião do ano. 

Das 46 casas que responderam essa pergunta no nosso questionário, houve um aumento das expectativas em torno dos 9,5% para o fim de 2024 desde novembro, mas ainda não o suficiente para definir um consenso.  

No entanto, podemos observar que 76% acreditam que a Selic termine o ano em 9,5% a.a., ou menor que isso. Ao mesmo tempo, o Boletim Focus do Banco Central do Brasil registra a mediana das expectativas para a taxa selic em 2024 de 9,25% a.a. As projeções se encontram em linha também com o mercado futuro, que precifica a taxa de DI para dezembro de 2024 próxima de 9,20%. 

Número de respostas em dezembro: 47

Inflação:

Para o IPCA, na Órama, projetamos o índice fechando o ano de 2024 em 4%. Para essa pergunta, as respostas dos gestores foram as mais consensuais com 71% dos respondentes com projeções entre 3,50% e 3,99%. 

É válido mencionar que o estudo mostrou que 100% das respostas estão entre 3,50% e 4,50%, isto é, uma taxa igual ou menor à esperada para esse ano, de 4,51% de acordo com o Boletim Focus. Além disso, dado que a meta de inflação para 2024 é 3,00%, com intervalo de tolerância de 1,5 p.p. para cima ou para baixo, observamos também que 100% das respostas se encontram dentro da banda da meta no próximo ano. 

Contudo, existem alguns riscos inflacionários que ainda não são totalmente incorporados no cenário base, seja por dúvidas em relação à magnitude do impacto ou pela probabilidade dos eventos. Listamos os principais pontos monitorados pela nossa equipe que podem impactar, positiva ou negativamente, a dinâmica de preços em 2024: 

  • Efeitos do El Niño: 2024 contará com a presença do fenômeno meteorológico El-Niño, que altera as condições climáticas do país pelo menos até a metade do ano. Ainda incerto em relação a sua intensidade, monitoramos seus efeitos principalmente sobre as safras agrícolas e sobre o nível pluvial. A alteração desses fatores deve, não só pressionar o preço dos alimentos, como da energia elétrica.  
  • Volatilidade dos preços de petróleo: diante dos conflitos recentes no Oriente Médio, região crucial para o escoamento de petróleo mundial, é importante acompanhar os efeitos inflacionários altistas de uma potencial escalada das tensões na região. 

  • Alterações de tributos: com a intensa agenda de votações econômicas no Congresso, previstas para ter continuidade em 2024, acompanhamos como as mudanças nos tributos afetam os preços. A principal mudança que esperamos é a alteração das alíquotas modais do ICMS para alguns estados, que, nesse caso, é definida diretamente pelas assembleias legislativas estaduais. 
  • Eleições municipais: as eleições municipais de 2024  trazem riscos de medidas eleitoreiras, principalmente em transportes e saneamento. Já vemos alguns prefeitos com medidas de zeragem da tarifa dos transportes públicos, totais ou parciais, que são vetores baixistas para a inflação. 
  • Elevação da massa salarial: nas últimas divulgações da PNAD, vimos um aumento substancial da massa salarial da população brasileira, atingindo patamares históricos, e contraditórios com o atual momento do ciclo econômico, de contração monetária. Esse aumento pode levar a pressões altistas nos preços, principalmente no setor de serviços. 

Número de respostas em dezembro : 45

Atividade econômica:

Na Órama, projetamos que o PIB de 2024 desacelere para 1,6%. No nosso levantamento, vemos 69% dos gestores estão com as expectativas de crecimento variando entre 1,26 a 2,00% Dos 31% remanescentes, 16% apostam em um crescimento acima de 2,00%. Ao mesmo tempo, a mediana da projeção para 2024 no Boletim Focus é uma alta de 1,51%, em linha com o intervalo majoritariamente respondido pelos gestores. 

Contudo, ambas as projeções ainda divergem substancialmente do número oficial da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, que estima crescimento de 2,20% em 2024.

Enxergamos que um fator que pode explicar essa diferença se relaciona às diversas métricas usadas para mensurar o crescimento do agronegócio. O segmento agro vem aumentando de relevancia no PIB, especialmente em 2022 e 2023. Contudo, é complexo medir seus impactos em outras atividades e se soma a isso as incertezas relacionadas ao efeito do El Niño. Assim, as projeções acabam variando bastante e recorrentemente o mecado subestima a força do agro.

Número de respostas em dezembro: 51

Bolsa:

Na Órama, projetamos que o Ibovespa termine dezembro de 2024 aos 150 mil pontos. No nosso estudo, 45% dos entrevistados projeta um índice entre 131 e 140 mil pontos, e 92% acreditam que será maior do que 131 mil pontos. Tendo em vista que a bolsa caminha para encerrar 2023 próxima dos 130 mil pontos, vemos que o mercado enxerga alta, porém ainda com ganhos relativamente limitados para o próximo ano.

Por aqui, pesa positivamente um cenário de cortes de juros com uma inflação controlada. Porém a maior desconfiança permanece sendo a em relação à postura fiscal do governo e a meta de déficit primário. Além disso, é preciso continuar avançando nas reformas estruturais, em especial da reforma tributária, que ainda precisa ser regulamentada via leis complementares e tem outras etapas, como a reforma da renda para ser encaminhada. O ambiente externo também influencia o humor global para o mercado de ações. A extensão e o momento de início do ciclo de afrouxamento monetário nos EUA seguem incertos, e são peças importantes que impactam diretamente na própria taxa de juros brasileira. Assim, a depender dessa trajetória dos Fed Funds, os ativos de risco globalmente podem ser beneficiados.

Número de respostas em dezembro: 38

IPCA

4,0%

PIB

1,6%

SELIC

9,5% a.a.

DÓLAR*

R$ 5,00 a 5,10

IBOVESPA

150 mil pontos

Confira os relatórios específicos para cada um desses indicadores em PROJEÇÕES MACRO.

Com várias perguntas em aberto, continuamos cautelosamente positivos com o panorama econômico-financeiro do Brasil em 2024 e continuaremos monitorando os riscos citados e o cenário de forma ampla. Acompanhem a evolução das projeções da Órama pelo nosso Portal de Análises e as alocações recomendadas para cada perfil de investidor com as nossas Estratégias Mensais.


Para acesso à metodoloria do estudo, clique aqui:

"Este material foi elaborado pela Órama DTVM S.A.. Este material não é uma recomendação e não pode ser considerado como tal. Recomendamos o preenchimento do seu perfil de investidor antes da realização de investimentos, bem como que entre em contato com seu assessor para orientação com base em suas características e objetivos pessoais. Investimentos nos mercados financeiros e de capitais estão sujeitos a riscos de perda superior ao valor total do capital investido. Este material tem propósito meramente informativo. A Órama não se responsabiliza por decisões de investimentos que venham a ser tomadas com base nas informações aqui divulgadas. As informações deste material estão atualizadas até 19/12/2023."


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