Fundos Imobiliários: O que esperar do segundo semestre de 2023?
No primeiro semestre de 2023, presenciamos uma interação intensa entre eventos políticos e econômicos. As mudanças nas expectativas dos agentes movimentaram os juros que impactaram diretamente o segmento imobiliário. Neste texto, com o benefício da retrospectiva, iremos analisar os principais eventos mês a mês, reconstruindo esse período com o foco no mercado de FIIs.
Direto ao ponto:
Você precisa saber
Utilizaremos esses indicadores ao longo do texto, portanto vale lembrar que:
1) A NTN-B de longo prazo é a principal referência utilizada no mercado de Fundos Imobiliários. A NTN-B é um título público indexado ao IPCA que oferece uma taxa de juros pré-definida mais a correção inflacionária. Presume-se que os ativos dos FIIs são atualizados pela inflação, o que é justificável, uma vez que a maioria dos contratos de aluguel são revisados anualmente pela inflação (IGP-M ou IPCA).
A NTN-B é considerada um “ativo livre de risco”, pois parte da premissa de que o governo federal honrará sua dívida com os credores. Em contraste, os Fundos Imobiliários carregam riscos como inadimplência, vacância, redução de aluguel, entre outros. Por essa razão, o rendimento anual dos FIIs deve ser superior ao retorno da NTN-B de longo prazo.
2) A curva de juros futuros é um gráfico que representa as taxas de juros esperadas para diferentes prazos no futuro, com base nos contratos de juros futuros (contratos DI) negociados no mercado financeiro. Esses contratos são acordos padronizados negociados em bolsas de valores que têm como ativo subjacente a taxa média de juros praticada no prazo definido.
Por exemplo, se o contrato de DI Futuro para Jan/2026 estiver sendo negociado a uma taxa de 12,05%, isso significa que o mercado espera que os juros entre hoje e o vencimento fiquem, na média, em 12,05%. Nesse sentido, quando o mercado precifica um aumento de juros chamamos de “abertura da curva”, e quando a expectativa é de queda, ocorre o movimento de “fechamento da curva”.
Exemplo: Supondo que em um mês a expectativa vá de 12% para 11,5%. Dizemos que houve um fechamento de curva de 50 bps. Basis Points (bps) significa ponto base, onde cada 0,10% equivale a 10 bps. Os investidores e analistas costumam acompanhar de perto a forma da curva de juros, pois ela pode fornecer insights sobre as expectativas do mercado em relação ao crescimento econômico, à inflação e à política monetária.
Sobre o primeiro semestre de 2023
Janeiro: desconfianças com o novo governo
No início de 2023, havia incertezas significativas sobre a gestão política e econômica do novo governo. A nomeação de Fernando Haddad como ministro da Fazenda gerou dúvidas quanto ao controle dos gastos públicos. Enquanto isso, o Banco Central estava atento à inflação e ao risco fiscal. Essas incertezas levaram a uma abertura de 130 pontos-base na parte longa da curva dos juros futuros entre o primeiro turno das eleições e o final de janeiro.
Fevereiro: início do novo arcabouço fiscal
Durante os meses de janeiro e fevereiro de 2023, o Ministério da Fazenda enfatizou o compromisso com a responsabilidade fiscal, buscando tranquilizar o mercado. Consequentemente, começaram a surgir fluxos de recursos do exterior na bolsa brasileira. No entanto, a volatilidade ainda permanecia alta devido aos ruídos em torno da elaboração do novo arcabouço fiscal. Além disso, o evento de fraude envolvendo a empresa Americanas aumentou a aversão ao risco por parte dos investidores. Essa combinação de fatores resultou em uma abertura superior a 40 bps na taxa de juros futuros de curto e médio prazo nos primeiros dois meses do ano.
Como podemos observar no gráfico abaixo, sobre o 1º semestre de 2023, os juros futuros recuaram de forma bastante expressiva a partir, principalmente, de março. O IFIX, por sua vez, vem em uma trajetória de alta persistente desde o início de abril.
Nos dois primeiros meses de 2023, o mercado de Fundos Imobiliários foi fortemente afetado pela incerteza e abertura da curva de juros, resultando em uma queda acumulada de 2,1% no IFIX. Os Fundos de Tijolo, que investem em imóveis físicos, foram os mais impactados durante esse período de turbulência.
Março e Abril: IPCA animador vs. Problemas no segmento High Yield
Em março e abril, houve o começo da reversão nas expectativas do mercado com a apresentação do arcabouço fiscal e a divulgação do IPCA de março abaixo das projeções. Isso proporcionou um cenário mais claro para investidores e agentes econômicos, resultando em uma queda significativa, superior a 80 bps, no DI Futuro de curto e médio prazo. Em 14 de abril, o Boletim Focus também indicou uma redução nas expectativas da Selic, projetando, pela primeira vez, 12,5% para o final de 2023.
Apesar da expectativa de melhoria nos juros futuros, o mercado de Fundos Imobiliários ainda não havia sido impactado positivamente. Os Fundos de Crédito, especialmente os de perfil mais arriscado – high yield – enfrentaram dificuldades devido aos juros altos e à desaceleração econômica. Até março, o índice IFIX acumulou uma queda de 3,76%.
Somente em abril, com uma alta de 3,5%, houve uma recuperação das perdas do primeiro trimestre, retornando aos 2.860 pontos – patamar em que o ano havia começado.
Maio: O começo do novo ciclo?
Após 6 meses, o IFIX retoma os 3.000 pontos em maio, alcançado anteriormente apenas em out/2022 e dez/2019. Tivemos a aprovação do arcabouço fiscal pela Câmara com algumas alterações positivas no texto pela interpretação do mercado, trazendo regras mais duras no controle de gastos. Naquele mês, o principal índice do mercado de FIIs subiu 5,4%, impulsionado pela melhora da perspectiva fiscal e possível redução de juros. Os Fundos de Recebíveis, bastante desgastados em abril, ajudaram a puxar essa reação. As curvas de juros fecharam fortemente e acumularam queda de aproximadamente 80 bps na parte curta e média da curva.
Junho: Perspectivas se consolidando
Em junho, o IFIX continuou sua trajetória de alta, apresentando um desempenho de 4,71%. Essa valorização foi influenciada pela divulgação da inflação de maio, que ficou abaixo das projeções, animando o mercado em relação aos cortes de juros previstos ainda para 2023. Com isso, tivemos mais um mês de fechamento das curvas de juros, próximo a 80 bps.
Com uma perspectiva cada vez mais clara de queda nos juros, o mercado acelerou a compra de ativos considerados mais descontados, com destaque para os segmentos de Logística e Lajes Corporativas, que apresentaram, em média, altas no mês de 8,5% e 6,9%, respectivamente.
Além disso, a ata do Copom indicou a possibilidade de iniciar o ciclo de cortes já a partir da reunião em agosto, o que impulsionou ainda mais o otimismo do mercado.
Ao final do semestre, o IFIX acumulou uma alta de 10,06%, registrando o melhor desempenho em um semestre desde a segunda metade de 2019. Esse resultado reflete a melhora das perspectivas econômicas e a confiança dos investidores no cenário de juros em declínio.
O que esperar do segundo semestre?
As perspectivas para o segundo semestre são bastante otimistas para o mercado de Fundos Imobiliários. O IFIX está próximo de alcançar uma marca histórica de 3.253 pontos, atingida em janeiro de 2020. Com a inflação sob controle e a expectativa de cortes na taxa Selic, espera-se uma resposta positiva dos FIIs ao novo ciclo monetário.
Com base em estudos anteriores, o mercado costuma antecipar o fim do ciclo de aperto monetário. Em 2016, por exemplo, a recuperação começou 10 meses antes do primeiro corte na Selic, e em 2019 foram 9 meses de antecedência. A análise atual indica que o mercado está novamente se comportando dessa forma, com a alta iniciada em abril sendo um movimento de antecipação dos cortes. O time de Macroeconomia da Órama projeta que na reunião de agosto, o Copom já reduza a Selic em 0,25 ponto percentual.
Com esse novo ambiente de juros em queda, o investimento em renda variável se torna mais atrativo em relação à renda fixa, cuja rentabilidade é afetada pelos juros e inflação. A expectativa é que a alta do IFIX continue durante o ciclo de normalização da política monetária, que inclui uma sequência de cortes até o segundo semestre do próximo ano, chegando à taxa terminal entre 9% e 9,5%. Isso torna os Fundos Imobiliários uma opção atrativa para investidores que buscam rendimentos mais favoráveis em um ambiente de juros em declínio.
No gráfico abaixo apresentamos a evolução das expectativas para o ano de 2023 e 2024 de acordo com o Boletim Focus.
Fundos Imobiliários ainda muito descontados
Um conceito fundamental no mercado de FIIs é o P/VP, que representa a relação entre Preço (P) e Valor Patrimonial (VP). O VP de um FII corresponde à avaliação dos ativos que compõem a sua carteira, enquanto o valor de mercado é determinado pelo preço de negociação das cotas, podendo variar abaixo ou acima desse valor.
Quando o Valor de Mercado está abaixo do Valor Patrimonial, dizemos que o Fundo está “descontado”. Por outro lado, se o mercado está precificando as cotas muito acima do VP, pode ser um indício que está “caro” para aquisição.
Ao observarmos os cinco Fundos de Lajes Corporativas mais negociados do mercado, constatamos que a média do desconto nos preços é de 17% em relação ao valor patrimonial e Dividend Yield médio dos últimos 12 meses é de 8,14%. É importante ressaltar que o segmento está em um ciclo de recuperação após a recessão iniciada em 2020 devido à pandemia e diminuição da demanda por espaços de escritório. Espera-se uma melhora no próximo ano para o segmento, à medida que algumas empresas que adotaram o home office retornam aos escritórios físicos, impulsionando a demanda e possibilitando a renegociação dos contratos vigentes.
Além do segmento de Lajes Corporativas, shoppings e logística também estão significativamente descontados. Esses fundos apresentam distribuição de dividendos mais estáveis por conta de contratos de aluguel com valores e prazos pré definidos. Esses Fundos caracterizam-se pela valorização patrimonial ao longo do tempo, com avaliações realizadas a cada seis ou doze meses. Os juros mais baixos impulsionam a economia, estimulam a demanda por financiamento e valorizam os ativos imobiliários.
Fundos Imobiliários de Crédito também se beneficiam?
A resposta é sim, com uma projeção de inflação mais controlada, torna-se mais fácil prever o cenário futuro, tanto para devedores, quanto para credores. Isso, por sua vez, tende a impulsionar o mercado imobiliário e aumentar a demanda por crédito. A redução das taxas de juros também contribui para essa expectativa, uma vez que diminui o custo do endividamento para empresas alavancadas e estimula o financiamento para aquisição de imóveis.
É importante ressaltar que, ao contrário dos Fundos de Tijolo, os Fundos de Crédito não estão tão descontados atualmente. Esses fundos geralmente têm seus retornos atrelados à inflação e ao CDI, o que pode resultar em variações mais significativas em suas distribuições, seguindo o desempenho desses índices. Assim, é comum que esses fundos apresentem um preço de mercado próximo ao seu valor patrimonial, uma vez que os ativos da carteira tem seus valores ajustados de acordo com as condições do mercado mensalmente.
Para o ano de 2023, espera-se que a taxa de juros permaneça em patamares de dois dígitos, e alguns FIIs manterão uma distribuição robusta nos próximos meses, especialmente os que têm exposição majoritária em CDI. Ademais, a queda nas taxas de juros terá um efeito positivo no processo de remarcação dos ativos de crédito dos Fundos, impulsionando o aumento de seu Valor Patrimonial.
Mercado de FIIs segue crescendo e aumentando liquidez
Nos últimos anos a indústria de Fundos Imobiliários vem se consolidando e o momento de juros mais altos serviu para reafirmar algumas teses e consolidar gestoras. Durante esse tempo, ocorreram incorporações e liquidações de alguns Fundos, bem como associações de gestoras, e observou-se um aumento significativo da participação dos cotistas nas tomadas de decisão.
Apenas em 2023 já tivemos um aumento de 4,4% no valor total do Patrimônio dos Fundos e mais de 200 mil novos investidores, chegando ao total de R$ 210 bilhões de Patrimônio total e 2,2 mihões de investidores. Esse número é quase o dobro em relação aos investidores que existiam ao final de 2020. Tais movimentos, aliados à queda da taxa de juros, proporcionam maior liquidez para o mercado de Fundos Imobiliários
Essa maior liquidez viabiliza o crescimento dos Fundos por meio de follow-ons e também a criação de novos Fundos com ofertas públicas iniciais (IPOs), que estão previstas para acontecer no segundo semestre.
O gráfico ao lado mostra a evolução do volume negociado nos primeiros 6 meses em 2023, e a expectativa é de números ainda melhores no próximo semestre.
Prêmio dos FII sobre a renda fixa
Conforme passamos no começo do texto, utilizamos a NTN-B de longo prazo como referência utilizada no mercado de FIIs.
O “prêmio de risco” é a diferença entre o retorno da NTN-B e o Dividend Yield dos Fundos Imobiliários, e esse valor varia conforme o momento do mercado. Esse prêmio representa o quanto de retorno adicional o investidor está disposto a obter em relação a um título livre de risco, considerando o risco envolvido nos Fundos Imobiliários. Em períodos de mercado aquecido, esse prêmio tende a ser menor, e o inverso se aplica em momentos de instabilidade.
Em nossa análise, observamos que a distribuição de dividendos dos Fundos Imobiliários estão com o prêmio acima da média histórica em relação a NTN-B de 2035. O IFIX apresenta Dividend Yield de 10,45% e a NTN-B de 2035 tem taxa de 5,33%. Isso significa que os Fundos Imobiliários estão com um prêmio de 5,12%, enquanto a média histórica é de 3,66%.
Conforme mencionamos acima, com a expectativa de cortes nos juros para os próximos meses, se torna favorável o cenário para investimento em Fundos Imobiliários. Esperamos que ocorra uma redução nesse prêmio atual para próximo a média histórica. Para isso acontecer, as cotas dos Fundos Imobiliários devem se valorizar no segundo semestre.
Reforçamos a importância de uma carteira equilibrada com investimento em Fundos Imobiliários. Ao investir em FIIs o investidor consegue diversificar em vários tipos diferentes de imóveis de alto padrão sob gestão das grandes gestoras do mercado com a vantagem de comprar e vender cotas a qualquer momento pela Bolsa de Valores. Os rendimentos são isentos de imposto de renda e a maioria dos Fundos realiza o pagamento mensal.
Para sugestões de acordo com o novo momento de mercado, conheça as nossas carteiras recomendadas.
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