Panorama Político – 09/12/2021
A IMPORTÂNCIA DOS VICES
por Lorena Laudares, Mestre em Ciência Política
O mercado financeiro, de forma geral, está buscando nos eventuais candidatos para a Presidência em 2022 duas características principais: compromisso com as reformas estruturantes e responsabilidade fiscal.
Hoje, nenhum dos presidenciáveis combina na sua própria figura esses dois atributos de maneira clara, como, em 2018, o João Amoêdo, por exemplo. Nesse contexto, as pessoas que cercam os candidatos a presidente ganham ainda mais relevância. O mercado já dá bastante atenção à escolha da equipe econômica, mas apenas nomes fortes e liberais não são suficientes para que seja preservado o equilíbrio fiscal.
É preciso olhar para as alianças e para a articulação política. E a escolha do vice-presidente se torna uma peça fundamental nesse tabuleiro, pois amarra acordos entre partidos ao longo do mandato.
Bolsonaro com uma equipe liberal, mas com a articulação política falha, não conseguiu avançar com as reformas, como era a intenção do ministro Paulo Guedes. Entendemos que a pandemia de covid-19 teve um papel importante nesse atraso, mas não é possível colocar toda a conta no colo do vírus.
Nesse momento de reflexão sobre as eleições de 2022, é importante compreender que a agenda de reformas depende umbilicalmente da capacidade do governo de articulação no Congresso, dado que qualquer mudança via PEC precisa de aprovação de ⅗ das duas Casas em dois turnos de votação. Sem uma base parlamentar, a vontade de transformação da equipe econômica não se concretiza em mudanças de fato, e voltamos à estaca zero.
Por isso, o foco hoje vai ser analisar quais são os potenciais vices dos candidatos que já se apresentaram. Uma chapa capaz de somar características desejáveis e que sinalize ao mercado que a articulação possa ser bem-sucedida tem mais chances de prosperar com o andamento das reformas.
Antes, contudo, é preciso deixar claro que esse desejo por reformas não necessariamente encontra eco na sociedade como um todo, que hoje enfrenta desafios na economia real, como desemprego e inflação. Isso significa que a escolha dos políticos pode (e deve) levar em conta outros atributos dos vices. Tendo esse “mapa” em mãos, navegar pelas decisões, quando estas já estiverem postas, torna-se mais fácil.
LULA: o ex-presidente não tem problema para a articulação política, e a sua capacidade de coordenação de interesses é inquestionável. Para Lula, porém, o medo é o oposto: dado que ele é carismático, popular e um político habilidoso, o receio é que consiga fazer “tudo que deseja”, inclusive modificações no regime fiscal para permitir ao governo gastar mais.
O papel do vice do Lula então, deve ser de sinalizar moderação para conter eventuais impulsos populistas. Nesse sentido, Geraldo Alckmin, que foi um dos fundadores do PSDB, cumpriria bem essa função. Alckmin está insatisfeito com seu partido. Ele queria ser indicado para concorrer ao governo de SP, mas João Dória, que venceu as prévias para presidente, prefere deixar o seu vice, Rodrigo Garcia, como sucessor.
A saída de Alckmin do PSDB é dada como certa, e PSD e PSB estão entre as principais opções. Pelo PSD, o caminho para ser candidato a governador está aberto. Em uma eventual filiação ao PSB, as negociações para compor uma chapa com Lula se tornam mais fortes, dado que o PSB cogita formar uma federação partidária com o PT. Ser vice de um petista, para o (futuro-ex-) tucano é um risco, pois pode perder mais apoio ao estar do lado de um partido contra o qual sempre proferiu críticas. Mas do ponto de vista da importância e poder político, o Palácio do Jaburu não é de se jogar fora.
Então, para Lula, uma chapa com Alckmin soma atributos importantes para as eleições do ano que vem e parece ser do interesse de ambas as partes.
BOLSONARO: diferentemente de Lula, a principal dificuldade de Jair Bolsonaro é a articulação política. Se em 2018 a presença dos militares, e de Hamilton Mourão especificamente, foi considerada como uma âncora moral e de bom senso no governo, com o mandato chegando ao fim, percebemos um esvaziamento dessa ala.
Os militares foram saindo de cargos-chave para abrir espaço aos novos aliados do Centrão. Em prol de sua governabilidade, Bolsonaro foi esvaziando o poder que os militares tinham no início.
Com isso em mente, há dois nomes cotados para serem vice de Bolsonaro: o General Braga Netto e o Ministro das Comunicações, Fábio Faria.
Braga Netto, atual ministro da Defesa, assumiu o posto quando foi substituído na Casa Civil pelo também general Luiz Eduardo Ramos. Ramos também não durou muito tempo no cargo e foi logo alvo de mais uma dança das cadeiras, cedendo espaço para Ciro Nogueira, presidente licenciado do Progressistas.
O general Braga Netto tem a confiança pessoal do presidente e teve uma passagem de apenas 1 ano pela Casa Civil, responsável pela articulação. Uma lição aprendida no governo Dilma é que um vice confiável e alinhado com o presidente é essencial para a permanência no poder.
Fábio Faria, por outro lado, se destaca em quatro pontos: é do Rio Grande do Norte; é um político profissional conhecido por ser um bom articulador; é do PSD, o que traria o apoio da sigla para o governo; e parece ter uma interlocução boa com o empresariado. Faria, porém, como qualquer político do Centrão, traz consigo uma parcela de desconfiança de Bolsonaro.
JOÃO DÓRIA: o vencedor das prévias do PSDB não é dos articuladores tidos como mais perspicazes. Ele, que veio de fora da política em 2016 nas eleições para prefeito de São Paulo, acumulou bastante poder pelo conflito aberto que cravou no centro do partido. E isso não é muito bem visto pela classe política tradicional. A divisão dentro do PSDB, explicitada nas prévias, pode levar a uma eventual saída de Alckmin. O racha com Aécio Neves também não é positivo para um esforço coordenado de campanha em 2022.
Além disso, a carta na manga que Dória tinha, a vacinação, parece estar perdendo relevância a cada dia. Ele apostou muito fortemente na oposição que fez à Bolsonaro no início da pandemia, defendendo e protagonizando a vacinação. Porém, com 70% da população vacinada, a pandemia, em si (caso a ômicron não evolua para uma nova onda), não deve ser o tema principal dos debates das eleições. E esse feito já está quase esquecido.
Dória já comentou que gostaria de ter uma mulher como vice e, nesse contexto, surge o nome de Simone Tebet do MDB. A senadora já é pré-candidata pelo seu partido, e teria que abrir mão de ser cabeça de chapa. Tebet, porém, pode ser um nome interessante para Dória, porque é do Mato Grosso Sul e tem uma proximidade com as demandas ruralistas, o que ajuda a somar o agro ao industrial-financeiro, já representado pelo atual governador de SP. Ela ganhou alguma projeção nacional também pela sua participação ativa na CPI da Pandemia.
O presidente do PSDB, Bruno Araújo, comentou que trabalha para construir uma candidatura à Presidência competitiva, que junte os nomes da chamada 3ª via. Citou, inclusive, que Sergio Moro seria um “grande vice” de João Doria. O ex-juiz e ex-ministro, contudo, não parece inclinado a ceder e retirar a sua candidatura.
SERGIO MORO: o ex-ministro do Bolsonaro tem a seu favor o legado da Lava-Jato, que permitiu que ele fosse conhecido nacionalmente. Porém, o outro lado da moeda do lavajatismo é uma indisposição do Congresso para com essas investigações. Ou seja, se estamos olhando para a articulação como um ponto importante, Moro conta, de largada, com um pé atrás dos políticos.
A filiação do Podemos pode trazer capilaridade e amplitude política à sua candidatura, principalmente se houver uma aliança com o União Brasil (fusão PSL e DEM). O União Brasil já declarou que será oposição a Lula e a Bolsonaro, e há dois nomes na lista de possíveis vices de Moro: Luciano Bivar e Luiz Henrique Mandetta.
Bivar, que era presidente do PSL, é um bom articulador político e foi o responsável pela filiação de Bolsonaro ao partido em 2018. Ele é de Pernambuco, o que também é bom para agregar uma representação do Nordeste, onde Lula é muito forte. Porém, Bivar foi indiciado pelo escândalo de candidaturas laranja do PSL nas últimas eleições, e esse teto de vidro cria dificuldades para ele ser vice de Moro.
A outra opção é Mandetta, que foi demitido como Ministro da Saúde após divergências com o presidente quanto à política de isolamento social no período inicial da pandemia de covid-19. Portanto, já traz consigo a oposição a Bolsonaro. Ele foi deputado federal pelo DEM por dois mandatos. Apesar de interessante, uma chapa de centro-direita com dois ex-ministros de Bolsonaro pode sofrer resistência da política tradicional, e o pouco trânsito de ambos no Congresso pode ser prejudicial.
CIRO GOMES: enquanto Dória e Moro buscam se firmar como uma terceira via de centro-direita, Ciro tenta trazer esse pêndulo para a esquerda. Ex-governador do Ceará e ex-ministro dos governos Itamar e Lula, Ciro Gomes já concorreu três vezes à Presidência e, em 2018, ficou em 3º lugar, com 12,5% dos votos.
O pré-candidato do PDT vem se desentendendo com seu partido. Ciro não gostou de os deputados do PDT terem votado a favor da PEC dos Precatórios e havia suspendido a sua candidatura. Ele voltou atrás e continuou na corrida depois da orientação do PDT para que, no segundo turno da votação da PEC na Câmara, a sua bancada votasse contra a proposta.
O PDT está buscando alianças regionais em ambos os lados do espectro político, dando prioridade às dinâmicas de poder nos estados. Até o momento, Ciro e Carlos Lupi, presidente do partido, não
definiram a composição da chapa, mas também não rejeitaram nenhum nome. Já surgiram rumores em torno do apresentador José Luiz Datena e também da Senadora Kátia Abreu, que foi para a urna como vice em 2018. Os dirigentes do PDT, entretanto, acreditam que só conseguem negociar a vaga de vice com outros partidos se a candidatura de Ciro se tornar mais competitiva e ele se mostrar mais viável politicamente do que Moro.
O Datena, hoje sem partido, é uma incógnita. Ele cogitou ser candidato à Presidência pelo PSL, já pensou em ser vice de alguém, em migrar para o PSD e concorrer ao Senado, e, mais recentemente, mudou de ideia e disse que vai apoiar Doria e Rodrigo Garcia em São Paulo
Os partidos têm até o dia 15 de agosto do ano que vem para registrar as chapas no TSE, e essa composição pode mudar radicalmente até lá. O importante é que a capacidade de negociação e interlocução com políticos e a formação de uma base de apoio sólida no Congresso são essenciais para a aprovação de reformas. Apesar de, para o mercado financeiro, esse ser o racional, não necessariamente são essas as características que vão prevalecer para as escolhas de cada candidato. Há questões como inflação, desemprego e alívio de pobreza, que, pela lógica política, devem ser tópicos mais quentes para o ano que vem.
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